Carol Silva
2 min readNov 22, 2020

Livre Traçado

Inspirado pelo verbete Desenho — Alexandre L. Alvarenga Júnior

Me chama atenção o poder do lápis em colorir uma superfície, seu corpo esguio que nos cabe de diferentes jeitos entre os dedos, que nos gera calos e se esvai a cada risco. Para que você possa utiliza-lo é necessário que o perca um pouco, pois a cada vez que o aponta e ganha uma nova oportunidade de traçado o seu tamanho diminui. Em seu primeiro dia de aula, em meio a outros materiais escolares, a principal ferramenta estará lá, o lápis e a princípio não é para escrever palavras, números, isso vêm depois, o que te inicia antes mesmo de saber o que escrever é o desenho e é nisso que este texto se trata.

Desenhos são de início abstratos, podem vir a tomar formas ou pelo menos se parecem com formas que conhecemos, mas também podem continuar abstratos ao longo da vida de quem o cria ou deixar de existir. Porque as brincadeiras mudam e os interesses também e com isso os desenhos vão cessando e dando espaço aos traços em formas de letras cursivas e números extensos, mas todos começamos com o desenho. Desenhar desde criança é quase um pleonasmo, afinal qual criança que não desenha, rabisca, colore? não existe qualquer novo navegante deste mundo que não se debruce sobre desenhos em seus anos iniciais de vida.

No entanto, me instiga em refletir sobre a ausência dos desenhos em nossa vida adulta, temos aqueles em que seguem com a prática como hobby e os que se profissionalizam, porém ainda assim o desenho desaparece da vida da maioria dos adultos. Podemos pensar que a realização do ato de desenhar de espontânea e prazerosa passe a ser mecanizada ou taxada de alguma forma por olhares alheios, do tipo que verão o desenho como feio, incompleto, incompreensível etc. Este pode sim ser um dos fatores que desestimulam a criança/ adolescente que desenha, pressionado por um perfeccionismo e a demanda de as “coisas parecerem o que são”, faça com que não consigamos enxergar a válvula de escape, o mecanismo transformador e criativo que desenhar possa ser.

Não é preciso ouvir que desenha bem para desenhar, acredito que ao crescermos passamos a ouvir ainda mais os ruídos externos e esses sons negativos nos moldam e nos influenciam, que não geremos expectativas sobre o que criamos apenas por criar. Hoje, amanhã ou semana que vem, vamos pegar nossos lápis e rabiscar, qualquer forma, qualquer jeito, qualquer coisa, para que lembremos de quando não dávamos importância as concretudes e tudo era uma abstração.

Carol Silva

Escrita despretensiosa na tentativa de esvaziar o que aflige e contemplar a quem se acanhe.